sexta-feira, 21 de maio de 2010

O futuro chegou!

Quem é da minha geração e portanto tem mais de 40, nunca pensou ver o Brasil como ele está hoje. Era impensável para esta geração sonhar com o Brasil sede da Copa, das Olimpíadas, sem inflação, com acesso a tecnologia de primeiro mundo e não apenas pagando a dívida com o FMI, mas também emprestando dinheiro!
Sem contar, agora, com a nossa novíssima posição de mediadores da paz, no Oriente Médio. Esta nova orientação mundial passa ao largo dos Estados Unidos e põe em cheque a mal disfarçada pretensão de dominação do planeta, pelos americanos. Claro que pode dar em nada. Mas só o fato de ter sido um acordo forjado por Brasil e Turquia já muda o mapa do poder no mundo e, de quebra, nos põe pela primeira vez nele.
Soa a “dor de cotovelo” as imposições de sanções americanas acompanhadas pelos próceres do dito primeiro mundo, que não foram capazes de avançar nas negociações. As sanções só atingem diretamente o povo que não é quem fabrica bomba e nem de longe impede o avanço do enriquecimento de urânio. Nada o impede, a bem da verdade. Mas o acordo, nas bases pensadas pela ONU, através da AIEA – Agência Internacional de Energia Atômica dá mostras de boa vontade do restante do mundo com a República Islâmica e caminha para a Paz desejada. ( O acordo prevê que o Irã entregue à Turquia 1,2 mil quilos de urânio pouco enriquecido para receber, no prazo de um ano, 120 quilos do combustível enriquecido a 20%, nível suficiente para o reator médico pretendido pelo país. Estados Unidos e Cia, dizem que o país tem interesses bélicos. Para constar: a bomba atômica requer enriquecimento a 90%).
Cresci ouvindo que somos o país do futuro. Parece que finalmente ele chegou.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Domingo Feliz

_Estão todos aqui?
Perguntava alguém. Começava então a contagem das crianças: um, dois , três...onze com a Delinha... Delinha, minha irmã, ainda no colo, era a caçula de uma turma de primos e primas que se espremiam como podiam no carro de meu tio, para domingos de passeio e poeira. Às vezes era um fusca e de que jeito cabiam dois ou três adultos, mais a criançada nele, é um destes mistérios que se perdem na infância.
Íamos ao sítio dos avós dos meus primos, se era época de manga. Lá tinha manga “Coração de Boi”, que eu nunca mais vi, e que era enorme. A casca tinha um tom entre o vermelho e o roxo, mais para o roxo se me lembro bem.
Mas, quando nos cabia escolher, o nosso lugar preferido era o Bosque em Águas da Prata para disputar um lugar nos balanços, gangorras e escorregadores instalados na sombra de árvores centenárias; tomar sorvete e comer milho verde cozido.
Justiça seja feita, o que nos motivavam eram os balanços e todo o resto era secundário. Voávamos em direção às árvores, sempre rindo, numa sensação de liberdade que ainda hoje invade meus sonhos quando neles vôo para lugares desconhecidos.
O balanço instalado com correntes eram altos e, para nós, alcançavam velocidade de cruzeiro ao deixar os pés próximo das folhas das árvores. Tinha sempre muita gente. Conseguir um balanço requeria certa estratégia e muitos conchavos entre os primos que “guardavam lugar” para quem estava sem. Lembro bem que depois que você dominava a arte de dar “galeio”, as vozes desapareciam e você se transportava para um lugar onde só existia você e as árvores. Tudo o mais era silêncio, o vento no rosto e um transplantar para um outro mundo. Dava um certo frio na barriga, mas o prazer era maior e o tempo voava junto a cada galeio.
Esta e muitas outras histórias lembramos no Dia das Mães, ao reencontrarmos primos que não víamos há muito tempo, além é claro da minha tia Lola querida e o Tio Antonio, especialista em historias de assombração e fim do mundo - que deixo para uma outra ocasião.
Éramos uma boa turminha, inseparável, com milhões de histórias comuns, que dividimos e relembramos recriando os domingos felizes e a rotina feliz das nossas infâncias.
Minha tia teve oito filhos. Havia a turma dos mais velhos, que eram uma referência, quase um modelo a ser seguido, mas que não pertenciam ao nosso grupo formado basicamente por meninas: éramos eu e minhas primas Isabel (minha xará e companheira inseparável), Regina e Márcia. Meu irmão João e o primo Paulo, mais novos, iam atrás de nós, com suas brincadeiras de meninos que incluíam caçar passarinho, pescar e andar de carrinho de rolimã, o que travessamente também fazíamos, o que valia muitos arranhões nos joelhos.
No domingo colocamos a vida em dia. Falamos dos filhos, da vida e principalmente rimos muito. Tinha esquecido como era gostoso rir de perder o fôlego, rir de passar mal, rir de si mesmo, dos outros, sem julgamento e até chorar de rir. As histórias muitas vezessó eram engraçadas para nós que as vivemos; os filhos e cunhadas que não estavam lá para ver, riam mais das nossas risadas e da nossa alegria, do que do fato em si. De novo éramos meninas que riem sem motivo, que conversam, conversam, conversam e o assunto nunca acaba. E ríamos de novo. Das lembranças, de nós mesmas, das situações, das bobagens adolescentes, dos paqueras, dos grandes amores que viraram pó... Nenhuma lembrança amarga. Tudo muito doce, com pitadas de saudade e salpicadas com sabores de infância a invocar os pratos simples que me tia fazia, mas que nos pareciam manjares divinos e que continuamos a perseguir nas comidas que preparamos, já adultas, para nossos filhos.
Não sei ainda o que , mas algo em mim, amoleceu. Foi como se tivesse voltado para casa e reencontrado um lado menina, descompromissado, quando era fácil ser feliz, tudo era bonito, gostoso e a vida uma constante aventura.
Hoje o sol amanheceu com um brilho diferente. Voltou a ser o mesmo sol da minha infância, quando o brilho espantava os fantasmas de São Paulo, onde morávamos, e que era uma cidade na minha lembrança toda cinza.
São João começava já na rodoviária, com sua profusão de cores, com o ônibus colorido que nos trazia e onde desembarcava num mundo de primas, brincadeiras e liberdade.
Neste domingo, olhando cada rosto, por traz dos sinais que o tempo marcou, o que prevaleceu foi o brilho dos olhos. Todos nós éramos crianças de novo. Sem medo, livres e com a vida toda pela frente. Falamos a linguagem do coração e mergulhamos na pureza e ingenuidade de nossas infâncias para, de alma lavada, enfrentarmos as nossas rotinas. Tomara estes vínculos possam agora ser mantidos.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Uma história fala mais que muitas teorias

Estou escrevendo um livro que vai retratar o que foi a I ONG Brasil, evento organizado pela Secretaria de Participação e Parceria de São Paulo, no final do ano passado. Participei desde o início da montagem, dos convites, da formatação do evento, dos temas das palestras, debates e mesas redondas. Fiz contato com inúmeras organizações sociais e no final conseguimos juntar mais de 500 ONGs e 120 palestrantes que se revezaram em Mesas Redondas e Discussões Plenárias. O livro contará a experiência de organizar o evento, formar redes sociais na sua divulgação, e o mais importante, irá compartilhar como foi fazer um evento a muitas mãos, com as decisões coletivas feitas por um grupo de voluntários provenientes de diversas organizações sociais. Mas o mais importante e que o livro irá democratizar as discussões e compartilhar as experiências, as tecnologias sociais vigentes, traçando um paralelo de onde está e para onde caminha o terceiro setor.
Estou cada vez mais convencida que tudo de mais moderno, mais significativo e realmente revolucionário no que diz respeito ao desenvolvimento social está nas mãos de um punhado de mulheres que formam o Terceiro Setor. São estas dirigentes que com seu trabalho, sua garra, sua coragem de fazer frente aos desafios, que tem as melhores respostas e soluções para diversos problemas.
Este é o papel do terceiro setor. O Estado tem uma função que é generalista. Não é de sua prática adentrar nos detalhes, nas especificidades. São as Ongs, com o seu exercito de voluntários que conseguem enxergar as diferença e produzir ações individualizadas, focadas em valores que passam ao largo da iniciativa privada e do poder público, como a solidariedade.
Também não se trata de formar sistemas de dependência. Claro que sempre haverá momentos em que é preciso mergulhar na miséria para resgatar o ser humano que lá está,no fundo do poço. Mas esta é uma ação que precisa ser pontual.
É preciso criar soluções, capazes de motivar o individuo, mostrar a ele o caminho e ajudá-lo a curar as feridas.
Os números do setor são impressionantes. No Brasil, segundo o professor Merege da FGV, são mais de 300 mil organizações sociais. Juntas elas movimentam cerca de 5% do PIB e empregam mais de 3 milhões de pessoas, além de cerca de 15 milhões de voluntários.
Nos Estados Unidos, o setor representa 13% do PIB, movimentando cerca de 1,7 trilhões de dólares em pesquisa divulgada em 2006.
Foi uma grata satisfação poder participar disso. E a cada capítulo que escrevo minha fé neste setor ainda nascente cresce e se fortalece.
Confira um trecho do livro, onde, numa discussão sobre o papel do educador social Marcos Lopez, professor e educador social, do Instituo Rukha, autor do livro Zona de Guerra, conta a sua trajetória, numa mostra corajosa de que para mudar é preciso querer, ter as ferramentas certas e encontrar alguns anjos de plantão:

“O Instituto Rukha surgiu da indignação de um empresário que passava todo dia na Faria Lima e via, todo dia, um menino trabalhando. Ele pensou:
_Puxa vida meus filhos estão em casa, rodeados de seguranças e este moleque aqui, trabalhando?
Ele parou o carro, chamou o menino, pagou um lanche para o menino que foi contando como a vida acontecia, como eram as coisas dentro da sua casa. O empresário que já queria montar uma ONG, teve uma idéia e chamou um Neuropsicanalista para fazerem isso juntos. Foram investidos R$ 30 milhões no projeto. O objetivo é juntar pessoas que tiveram, ou que tem experiência com o trabalho infantil, para atuar junto às famílias de meninos e meninas que estão trabalhando em faróis.
Começou com oito educadores, que ia para os semáforos . O Instituto oferece um auxílio desenvolvimento de R$ 350,00 para as famílias dos meninos de alguns faróis. A gente sabe que estes meninos tiram até R$ 800,00, R$ 1000,00 e se você for ver, os meninos no farol estão brincando. Estão brincando, correndo, jogando água um no outro. Mas não sonham mais. Nós colocamos de novo na escola, colocamos em um núcleo sócio-educativo e fornecemos uma oportunidade, devolvendo aos pais, também, a chance de sonhar. Tem mais um auxilio de R$ 150,00 para que a família possa fazer o curso que ela quiser. O papel do educador é acompanhar esta família. Levar no dentista, se for preciso... O instituto tem psicólogo, neuropsicanalista, pediatra e outros médicos.
A minha história dentro do Instituto é engraçada. Quando eu soube deste trabalho eu disse: é a minha cara este trampo! Me inscrevi, fiz o teste. Aí me chamaram e disseram:
_A gente gostou muito de você. Mas só que tem um porém: você não tem experiência com favela.
Puxa vida, como ela podia me dizer que eu não tenho experiência com favela? Aos sete anos de idade fui morar no Parque Santo Antônio, uma das áreas mais violentas da zona sul, de São Paulo, na década de 90. O Gil Gomes, uma vez falou que não entrava lá nem escoltado. Como uma mulher que vem do lado de cá da ponte me fala isso?
Quando mudei para o Parque Santo Antonio. Meu pai era alcoólatra e me batia. Conheci a Casa do Zezinho, que nem tinha este nome aos 10 anos. Ia com manga comprida, pra Tia Dag, pra tia Corina, não ver os hematomas e ninguém chamar a polícia para o meu pai.
Aos 12 anos, meus pais se separaram. Aos 14 anos eu fui expulso da escola, por ter assaltado a cantina à mão armada. Aí abandonei tudo e fugi para o Rio. Fiquei lá seis meses e conheci um traficante que me ensinou a manusear arma, como trabalhava a cocaína, a maconha, o crack. Depois conheci um estelionatário que me ensinou a falsificar RG, passar cheque sem fundo, como ludibriar.
Voltei, chamei os parceiros e falei:
_Mano, aprendi uma porrada de coisa da hora. E nós vamo ficá rico.
Aos 16, eu gerenciava a boca de fumo da quebrada onde eu nasci. Aos 17 anos, minha melhor amiga estava indo para o velório de uma outra amiga, que tinha morrido por causa do tráfico que eu gerenciava. E aí, voltando, fecharam o carro dela e fuzilaram ela. A mesma amiga, minha melhor amiga, que horas antes tinha me dito:
_Credo, se eu morrer não quero ser enterrada no cemitério São Luiz. Você promete pra mim?
_Vira a boca pra lá, eu disse, mas ela insistiu:
- Você promete? Eu prometi
O Cemitério São Luiz é um cemitério na Zona Sul de São Paulo, onde 40 a 45% do cemitério é ocupado por jovens e adolescentes entre 13 a 27 anos. Eu estava na estatística...Mas como eu tinha prometido, ficava feio eu deixar a mulher ser enterrada no Cemitério São Luiz. Ai, voltei na Casa do Zezinho e procurei a Tia Dag e perguntei se ela podia me dar o dinheiro para eu enterrar a minha amiga.
Ela me disse:
É... te dou. Mas quero saber quem é o indivíduo que vai vir aqui buscar dinheiro pra te enterrar. Pra enterrar o neném, do Parque Santo Antonio... Sai desta vida. Este bagulho não vai te levar a lugar nenhum.
Pensei. E decidi ir trabalhar na biblioteca na Casa do Zezinho. Na semana que eu comecei a trabalhar, meu melhor amigo pegou 67 anos de cadeia, por tráfico de drogas, homicídio.
Na biblioteca. Li um livro chamado “Capão, pecado”. Aí eu pensei: Nossa, o cara escreveu a quebrada dele. Vou escrever a minha também. Um dia eu vou ser igual o Ferrèz. E comecei a escrever...
Aí, um dia, uma amiga veio me falar:
_ Ó Neném, passei no vestibular.
_ Vestibular para quê?
_ Pra Administração.
Eu falei:
_ Bem a tua cara, bem Zé povinho. Vai administrar a vida dos outros...
Ela só deu de ombros.
Na mesma hora, tava descendo a rua, veio um outro mano.
_Oh, Neném, passei no Vestibular.
Eu de novo:
_Vestibular de que?
Ele:
_ De turismo.
_É vai lá viajar com os playboizinho...
Ai ele me disse:
_Melhor viajar com os playboy que ficar ganhando R$ 300,00 a minha vida toda.
Eu fiquei pensando...Na época era o que eu ganhava. A primeira vez que vim aqui, no Center Norte, foi para ganhar R$ 300,00 e fazer faxina e limpar o banheiro.
Caiu a ficha. Não vou ganhar R$ 300,00 a vida toda. Estudei, fiz vestibular e entrei na Universidade de São Paulo. Um ano e meio de faculdade eu fui na escola em que tinha sido expulso para dar aula.
A diretora me viu entrando e só disse:
_ Vixe! Aqui não tem vaga pra você, não. Vai estudar lá no Sussumo.
O Sussumo, o Sussumirata , era uma escola no Jd. Lídia, que era onde tinha a maior boca de fumo do Capão.
_Mas quem foi que falou pra você que eu vim estudar! Eu vim ser professor!. E mostrei para ela o papel da escola.
Ela me olhou, olhou de novo, chamou a professora, a coordenadora, que já chegou perguntando que projeto eu tinha para a escola, pra me barrar.
Eu pensei um pouco e disse:
_ Eu tô ligado que aqui nesta escola some carro. Aqui dentro tem boca de fumo...Em dois meses eu prometo que não vão sumir mais carros e nem vai ter boca de fumo.
_ Como você vai fazer isso? Ela me perguntou.
_ Como é que eu vou fazer é problema meu! Topa?
_Tá bom, vamo ver...Ela falou meio desacreditada...
Dei dois meses, sabe por que? Porque eu conhecia os entrujão, os caras que roubavam os carros e o dono da boca. Cheguei e falei:
_Não tem mais venda de droga na escola. Carro não sai mais. Pronto, resolvido.
E como é que uma mulher do Instituto Rukha vem me dizer que eu não tenho experiência em favela!
Pensando em tudo isso que vivi falei pra ela:
_ Minha senhora, como é que eu faço pra adquirir, então, esta experiência em favela?
Ela me devolveu:
_O que é que você sugere?
_ Trabalho três meses, de graça, para entrar no Instituto e a senhora me avalia. Se eu não passar nestes três meses, a senhora me chuta. Se não, eu fico.
_ Fechado! Disse ela.
Fui trabalhar três meses de graça. Sabe o que é trabalhar três meses de graça, sem dinheiro pra comer, para pagar ônibus? Três meses passando por baixo da catraca, para trabalhar! Quando não tinha mesmo o que comer, ia almoçar na Casa do Zezinho.
Depois de três meses fui efetivado... Mas aí fiquei vendo...A gente faz as visitas nas casas. Mas só olhava as famílias que dávamos o auxílio. A instituição atende 200 famílias. Mas achava muito pouco. Um dia uma criança me perguntou como fazia para entrar na ONG. Eu disse que era um negócio complicado, porque só tem um cara que financia e não abre vaga.
Aí uma mãe me perguntou a mesma coisa. Eu disse o mesmo. Ela pediu para eu falar com o filho dela e disse que ia chamar, porque ele tava trabalhando.
Eu falei pro moleque:
_ Você tava trampando, pode voltar lá ,depois a gente fala.
_Não, eu faço um doze aqui. Passo droga...
_Sai dessa, maluco! Eu disse. E aí contei pra ele a mesma história que eu to contando aqui. Mas aí, ele me disse:
_Se eu sair do tráfico vão tomar a minha casa...
É que na casa dele ficava a boca.
_ Mas você quer sair? Perguntei
_ Quero.
_ Quanto tempo você precisa pra sair do crime?
_ Duas semanas, disse ele.
_Então tá, em duas semanas a gente fala.
Enquanto não tava dando as duas semanas, eu fui articular com a Tia Dag, na Casa do Zezinho. Fui no colégio Sieja, onde mais de 50% das vagas são para crianças com necessidades especiais.
Em consegui arrumar recursos para construir uma casa pra este moleque. Quando ele falou: Marcos, saí do crime, eu disse para ele vir comigo que eu tinha arrumado um emprego pra ele.
Coloquei ele para trabalhar no Sieja, para atender as crianças com necessidades especiais na escola.
Quando voltei no Acarati, no lugar que ele morava. Um cara, de cima de um cavalo, colocou uma pistola na minha boca. E me falou:
_ Malandro, o que é que você está fazendo aqui?
_O mesmo que você, parceiro. Respondi. Estou ajudando a sua comunidade. Acho que você faz o mesmo...
_ É nóis...Disse ele...
Eu fui me aproximando de tal jeito do cara, que ele foi me contando que o sonho dele era trabalhar com cavalos, que ele queria sair do tráfico para trabalhar em Haras. Hoje é um dia especial, porque hoje ele foi aprovado e vai embora, para trabalhar, num Haras.
Ele já saiu do crime eu também pus ele para trabalhar no Sieja. Por que trabalhar com pessoas com necessidades especiais? Para se colocar no lugar do outro. Para ver como é viver em uma cadeira de rodas, sendo cego, surdo.
O papel de educador social vai além da sala de aula. Precisa deixar para agir com a cabeça, quando estivermos numa sala, falando de metodologia. No resto é deixar o coração agir, deixar o coração falar pela gente. Balança as mãos, balança as pernas, a cabeça e deixa o coração falar. Se for agir com a razão não é assim. Enquanto o outro está falando, você está arquitetando para derrubar o outro. Mas se deixa o coração falar, aí é verdadeiro. Ele é a parte mais sincera da gente.
Ser educador social é transpor isso é ir além. É muitas vezes chegar na sua casa às 11 horas da noite porque estava fazendo uma mediação. A minha mediação de conflito é diferente da de outros. Às vezes é um cara que comprou uma pedra na boca e não tem como pagar e eu preciso ir lá e negociar a vida do cara, com o traficante.
Posso estar em casa dormindo, jogando futebol. Pode me ligar que eu vou. Eu faço isso porque eu tenho uma dívida com a sociedade. E pretendo nunca pagar esta dívida. Porque enquanto a educação não for um instrumento de inserção social, o mundo continuará este pé de guerra.”


Depoimento de Marcos Lopez