Em 10 de maio de 1944, o jornal O MUNICIPIO abria a sua edição estampando em letras garrafais: Protestamos!Poraceba?... Nunca. O jornal afirmava que havia circulado pela cidade, uma notícia de que o Serviço Geográfico do país, procurando mudar os nomes das cidades que existem em duplicidade, enviou um telegrama ao então prefeito da época, comunicando a mudança do nome da cidade para Poraceba.
Assim o jornal se manifestava: “O MUNICÍPIO, jornal inteiramente dedicado aos interesses da cidade, do seu povo e do seu bem estar moral e material, não concordará com tal mudança e lança, desde este momento, o seu veemente protesto”.
Poraceba é uma palavra do idioma conhecido como tupi-guarani. Uma língua, que na verdade nunca existiu, pois as nações tupis e guaranis eram distintas, com hábitos e linguagens diferentes.
O tupi antigo, mesclado ao tupiniquim, tupinambá, tupinaé, tabajara e outras línguas, somado ao português, deu origem à Lingua Geral, que predominou na Costa Brasileira, até 1750.
Mas o Tupi teve seu uso e ensino proibidos por Marquês de Pombal, em 1759, mandando o tupi para o esquecimento. Somente no final do século XIX é que o país voltaria os olhos para a língua Tupi esquecida.
Durante o Estado Novo, quando Getúlio Vargas estava no poder e quando o indianista Marechal Rondon havia se tornado uma lenda, havia um sentimento de valorização nacionalista. Getúlio, com o propósito de organizar o nome das cidades, que em muitos casos eram idênticos, resolveu mudar os nomes através de Decretos.
Nem sempre a mudança era bem aceita, mas, ainda assim, diversas cidades brasileiras tiveram seus nomes modificados.
No dia 17 de maio de 1944, o jornal volta a falar no assunto e transcreve parte do pronunciamento de José de Azevedo Oliveira, conhecido como “Zé Poeta”, no Rotary Club local.
Ele lembra que a cidade nunca teve outro nome, além de São João da Boa Vista. Em todos os registros oficiais, desde que era uma capela, passando depois a freguesia, vila e cidade, o nome São João da Boa Vista se manteve.
Nos primórdios da história sanjoanense, o lugar era conhecido como São João do Jaguari. No entanto, este nome nunca constou de nenhum documento oficial.
Zé Poeta lembra, ainda, que durante o governo paulista de Jorge Tibiriçá (governou São Paulo de 18/10/1890 a 07/03/1891) houve uma tentativa de mudança do nome. Naquela época, o governo já havia mudado o nome da cidade de Penha do Rio do Peixe, para Itapira (que significa Pedra Alta), e pretendia transformar São João da Boa Vista em Ceporama. Ele explicava que “Ce” significa “ ver”, enquanto “porã” significa bom ou belo. Logo, Ceporama, significava Ver o Belo. A iniciativa do governador Jorge Tibiriçá causou revolta na cidade.
Segundo o jornal, houve violentos protestos, comícios, muitos discursos e ameaças. Os políticos se movimentaram e tudo voltou à calmaria.
A ameaça de nova mudança também motivava ânimos poucos amistosos. Zé Poeta, inclusive, dizia que a denominação Poraceba estava errada. Segundo ele, “Porã” quer dizer bom, “Ce”, ver e “Bo” seria uma partícula substantivadora que torna o verbo um substantivo. Assim, “cebo” significaria vista. Portanto a palavra correta para substituir São João da Boa Vista seria Porancebo.
Diga-se de passagem, a emenda era pior que o soneto.
A polêmica foi esquentando. Em 21 de maio, do mesmo ano, o jornal republica uma notícia retirada da “Gazeta de Limeira”, do dia 17 de maio de 1944.
Sob o título “Nomenclatura Rebarbativa”, o articulista Léu Lauro (possivelmente um pseudônimo) assim começa o seu artigo “Faça-me tudo, mas não me troquem de nome”. Ele seguia afirmando que as cidades também tinham nomes e estes deviam ser respeitados. Depois, usa toda a sua verborragia para atacar “esta novidade” que assolava o país. “Se uma troca se faz imprescindível, que ao menos não escolha um nome tupi-guarani. É talvez a pior desgraça de feiúra que pode acontecer a uma cidade. São João da Boa Vista, por exemplo, está ameaçada de ser “Poraceba”. É mister que ouçais bem: Poraceba, para verificardes o horrível do atentado”.
Mais à frente ele diz: “Que morram de amores alguns indianistas pela paupérrima linguagem tupi-guarani e queiram com ela encher colunas de jornais e horas soporíferas de conferências, vá. Não queiram, entretanto, que a gente goste destas calamidades: Ibiúna, Iboruna, Pirapuana, Pacatuna, Arapiúna e outras unas portentosas. A gente aceita porque não tem remédio. Aceita mas não gosta. Não gosta mesmo”.
DESMENTIDO
No dia 27 de maio, o jornal conta que havia sido enviada uma carta ao dr. Antonio Cícero, do Jornal do Comércio, do Rio de Janeiro, pedindo que ele interviesse em favor de São João, junto ao Centro Geográfico, para que a mudança do nome não ocorresse.
Cícero ligou para Oliveira Neto informando que estivera no Centro Geográfico e que a mudança de nome, em São João da Boa Vista, não aconteceria.
No dia 31 de maio, o jornal publica carta recebida pelo professor Roque Fiori, escrita por Mário R. Nunes, funcionário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Nela, Nunes afirma que sobre o caso “poracebaico é pura invencionice”. Assim diz a carta: “Ontem estive com o dr. Cardoso, do Conselho Nacional de Geografia, informando-me ele, que trouxera o Embaixador Macedo Soares na Quinta-feira pp, de São Paulo, a relação dos municípios paulistas com a nova toponímia, para o qüinqüênio 44-48, da qual não figura São João da Boa Vista, para qualquer modificação. Estamos assim mais tranqüilos e o grande amigo não correrá o risco de se tornar poracebano ou poracebense.”
A carta punha fim à questão. Nunca se saberá de onde partiu a notícia divulgada pelas agências telegráficas e comunicada ao Prefeito Municipal. Se era brincadeira foi de mal gosto. Mas que surtiu grandes preocupações não há dúvida.
CARACOL
Outras cidades da região tiveram seus nomes mudados, em diversas épocas. Andradas, por exemplo, era Caracol. Antes, a cidade havia se chamado Samambaia e depois São Sebastião do Jaguari. O nome de Caracol é uma referência à Serra do Caracol, que faz parte da maior caldeira vulcânica extinta do mundo, com o diâmetro de 35km. Em 1925, a vila foi elevada à categoria de cidade, já com o nome de Caracol. Por iniciativa do presidente da Câmara Municipal, Orestes Gomes de Carvalho, em 1928, o nome da cidade mudou: Caracol passou a se chamar Andradas, em homenagem ao então governador de Minas, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada. A população não gostou muito. Mas como também não estava muito satisfeita com Caracol, o nome permanece até hoje.
CASCAVEL
Em 30 de novembro 1994, o Distrito de Cascavel foi reconhecido como município e emancipou-se de São João, para tornar-se Aguaí. Como já havia outras duas cidades com o nome de Cascavel, foi feito um plebiscito, na cidade, com uma lista de três nomes: Toripá, Tessaindaba e Aguaí. Para felicidade do povo cascavelense o nome Aguaí foi o escolhido.
Em Guarani, Aguaí significa redondo, fruta amarela, guizo de metal, guizo de cobra Cascavel, segundo informa Emílio Lansac, na edição do O MUNICÍPIO de 31 de dezembro de 1944.
Ele lança um pontificado para aquela cidade que nascia: “Que o nome Aguaí signifique, pois, por extensão, numa forma graciosa, o alvoroço, o entusiasmo do trabalho feliz de um povo oferecendo aos brasileiros os furtos maduros que um milagre de boa vontade e de esforço produziu em pleno descampado, sobre a areia escaldante onde se ergue, presentemente, a próspera e bonita cidade”.
O nome Cascavel naquela localidade era bastante antigo. Segundo relato publicado no O MUNICÍPIO na mesma data, a vila era conhecida como “Potreiro de Cascavel”, devido à existência de uma enorme cobra cascavel, moradora à margem de um Córrego. Potreiro, de acordo com o dicionário Aurélio, significa “Pequeno campo fechado, com pasto e aguada, destinado a recolher animais”.
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