quarta-feira, 28 de julho de 2010

São João na Revolução de 32

Entre 1930 e 1945, enquanto durou a ditadura instaurada por Getúlio Vargas, os únicos registros escritos, da vida da cidade, estão nas páginas do O MUNICÍPIO. Inclusive os referentes à Revolução Constitucionalista de 1932, que contou com combates na Cascata, até então, pertencente ao município de São João.
Getúlio fechou as Câmaras Municipais em duas ocasiões: Entre 1930 e 1935, e depois de 1937 a 1945, no período, em configurou o “Estado Novo”, quando o país vivia sobre uma sombria ditadura.
Com prefeitos nomeados, censura e a Câmara Municipal fechadas, os relatos, ainda que passíveis de falhas, estão nas páginas deste semanário que nunca deixou de circular, apesar das atribulações daquele momento.
O diretor do Jornal, desde 1914, era João Christiano Lühmann, o filho mais velho do fundador do O MUNIICIPIO, Carlos Lühmann. Ao lado da mãe Luise e do irmão mais novo Walter, João Lühmann era o comandante da redação.
Com textos absolutamente bem escritos, João Lühmann nos leva a um outro tempo. Idealista, íntegro e honesto, as páginas por ele lideradas são exemplos de como fazer jornalismo e dirigir jornais. Havia espaço para todas as crenças e correntes políticas. Havia coragem para denunciar e delicadeza para tratar os oponentes e, sobretudo, hombridade para reconhecer erros. Elegância talvez seja a principal marca deste período, ainda que veementemente, clamasse pelos ideais que acreditava.
Em 1944, João Lühmann morre. Toma o seu lugar Walter Lühmann, que ficará à frente da redação até 1956 e de quem falaremos em outra edição.

O GOLPE DE GETÚLIO
Nas eleições de 1930, o candidato da oposição, Getúlio Vargas, havia sido derrotado nas urnas. Alguns meses mais tarde, Vargas lideraria um golpe que o conduziria à presidência da República. A política brasileira do início do século XX era comandada pelos grandes proprietários de terra.
Setores da classe média, proprietários de terra sem representação no governo, além de jovens oficiais do Exército, não aceitam mais um governo a serviço dos fazendeiros do café. Diversas revoltas militares explodiram ao longo dos anos 20.
Com a grande depressão, em 1929, os preços do café despencaram. A saca, que custava duzentos mil réis em agosto de 29, passa a 21 mil réis em janeiro do ano seguinte. A crise atinge toda a economia brasileira. Mais de 500 fábricas fecham as portas em São Paulo e Rio de Janeiro. O país tem quase dois milhões de desempregados no final de 1929. A miséria e a fome atingem a maioria da população.
Em janeiro de 1930, o presidente da República, Washington Luis, de São Paulo, lança o também paulista Júlio Prestes para a sua sucessão.
A Aliança Liberal, uma frente de oposição, apresenta o gaúcho Getúlio Vargas como candidato à presidência, tendo o paraibano João Pessoa como vice. Mas as eleições dão a vitória ao candidato do governo.
Em julho de 1930, após o assassinato de João Pessoa, a Aliança Liberal se une aos militares e inicia uma revolução. O Presidente Washington Luis é deposto. O candidato eleito, Júlio Prestes, se refugia na Embaixada Inglesa.
Em 3 de novembro de 1930, após inúmeras batalhas, Getúlio Vargas assume a chefia do Governo Provisório. Era o fim da República Velha.

EM SÃO JOÃO
A cidade não passou imune à crise do café e à Revolução. O Jornal O MUNICÍPIO, fundado com a senha de jornal “ao lado do povo”, desde o início fez campanha para a necessidade de se tomar o poder das classes dominantes e de apoio à candidatura de Getúlio Vargas.
Mas tais fatos não podiam ser veiculados. João Lühmann assim explica, em 3 de março do ano seguinte. “O governo do Estado, nos dias angustiosos da revolução, proibia aos jornais a divulgação de notícias que não fossem as oficiais.
Em recompensa a essa obediência, fornecia notícias mentirosas do movimento, que sempre nos recusamos a publicar, pois antes silenciar do que ludibriar o público com as notas oficiais”.
Para cumprir a determinação oficial, cada cidade tinha um censor. “Nos saímos muito bem”, afirma João Lühmann, em 1931. Segundo ele, “O MUNICÍPIO continuou a sair regularmente e jamais o censor da imprensa - aliás um moço muito correto - pôde cortar uma linha sequer do nosso jornal”, escreveu João.
Estende-se, daí, o entusiasmo com que o jornal comemora a revolução de 24 de outubro de 1930.
No dia 15 de novembro de 1930, João Lühmann escreve um texto, diagramado em forma de mapa do Brasil, onde exalta os valores populares da revolução.
Não por acaso, dedica o texto ao Cel. Ernesto de Oliveira, “com respeito”, que era um dos coronéis do Café, da época. Diz João Lühmann: “Hoje se comemora a passagem de mais um aniversário da República.
Entretanto, no atual regime bem poucos dias de felicidade tivemos, pois a pátria vivia enxovalhada pelos abutres que se assentaram no poder, que viviam a oprimir o povo, roubando-lhe os direitos de liberdade nas urnas, em flagrante desrespeito à nossa Constituição. Crimes hediondos, roubos vergonhosos, esbulhos e fraudes foram praticados contra a nação e contra o povo brasileiro, pelos homens que se assenhorearam do bastão do mando, infelicitando esta grande pátria...”
Mais adiante, conclui João Lühmann: “Felizmente agora a pátria está livre dos exploradores que a aniquilavam.
Mas para isso precisou que se derramasse sangue brasileiro, precisou que o Brasil, novamente, se tornasse pátria grande, de muitos bravos, que souberam manejar fuzis e bramir espadas com o risco da própria vida, pela conquista de um ideal nobilitante... Vejo que no Brasil tudo é grande, inclusive os homens, pois os indignos foram postos à margem”.
Como o futuro tem a desvantagem de ainda não ter acontecido, mal podia supor, o democrata João Lühmann, do que estava por vir.
Ainda que o jornal fosse, desde o seu início, partidário das causas populares, nem por isso, deixava de abrigar, em suas colunas, artigos de pessoas com pensamento diametralmente oposto ao dos seus diretores.
Assim, em diversas ocasiões se vê críticas - até bombásticas - ao governo provisório de Getúlio Vargas.

A DEMOCRACIA

O tempo vai passando e cada vez mais, na redação libertária e democrática do O MUNICÍPIO, a convivência com a ditadura imposta por Vargas, a partir de 1930, causa mal estar.
No início de 1932, o clamor por uma Constituinte se faz sentir no jornal. Ainda que defenda o governo provisório, O MUNICÍPIO começa a pedir a instalação de uma Assembléia Constituinte, que redija uma nova Constituição e que traga, novamente, o país à sua normalidade, com eleições para todos os níveis de poder. Em quase todas as edições há artigos que pedem a volta de um regime democrático, ainda que defenda a legalidade do governo Vargas.
Dentre os pontos positivos do governo, o jornal destaca a legalização do Partido Constitucionalista, o reconhecimento oficial dos sindicatos e o aumento de salários, que beneficiaram a população.
No dia 3 de março de 1932, em edição comemorativa ao aniversário do jornal, os seus redatores anunciam: A Revolução fracassou. E fazem uma análise onde transparece a decepção com o governo. Alguns fatos corroboram para isso, dentre eles, o empastelamento do Diário Carioca e a proibição do Comício em Prol da Constituinte, que teria lugar em São Paulo em fevereiro daquele ano.
A partir de maio, com a morte de 4 estudantes paulistas, em Comício que apelava para que a Constituição fosse feita, O MUNICÍPIO adere à campanha em defesa de São Paulo.
Em 25 de julho de 1932 têm início os primeiros combates na Cascata, com voluntários sanjoanenses. O jornal até o fim da revolução faz um relato minucioso das lutas ali travadas, com nomes dos participantes, os apoios oferecidos pela comunidade e combates.
Em 10 de setembro de 1932, o jornal traz comunicado oficial onde o prefeito militar afirma que a cidade estava em poder dos federalistas. Mas a revolução não acabara. Nos jornais seguintes, saem publicadas cartas do “front”, que sanjoanenses, combatentes em outras paragens, enviavam.
A revolução constitucionalista termina em outubro. O governo vence. Mas a Constituição tão almejada é feita em 1934 o que dá o título de “vencedor moral”, da Revolução de 32, ao Estado de São Paulo.

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