Desde que iniciamos o debate sobre a destinação do lixo em São João da Boa Vista, tenho visto que estamos construindo algo novo, que passa por uma maneira nova de vivenciar a democracia e, também, pela forma de fazer Política, na medida em que entendemos política como uma forma de resolver problemas sociais e coletivos. Me refiro à “Política” assim, com P maiúsculo, que é muito maior que a política pequena e interesseira dos partidos.
A começar pela maneira como tudo isso começou. O debate teve início no Facebook, num grupo formado basicamente por ambientalistas que se uniram em torno da preservação de um Jatobá. Sabedores de que as ações ambientais estão interligadas ao cotidiano, o grupo se abriu para a esfera sócio-ambiental e o Fala São João se insurgiu no ambiente virtual, como um portal de discussão dos problemas e das delícias de morar em São João da Boa Vista.
Do universo virtual, o debate migrou para o mundo real e fez nascer um Fórum que trouxe para a cidade mais de 20 especialistas, que doaram o seu tempo e o seu saber, para ajudar a cidade a construir novos conceitos sobre um assunto árido para muitos, mas de intesse crucial nesta altura da história humana: a destinação do lixo, do qual somos todos co-produtores.
Os especialistas aceitaram o desafio e o fizeram com alegria e entusiasmo, motivados pela oportunidade de um debate aberto, sem que este fosse feito para validar ou inviabilizar um projeto específico, consoante com o que exige a novíssima Política Nacional de Resíduos.
Do Fórum nasceu a Carta do Lixo, nela contidos os princípios norteadores de uma nova postura municipal diante do problema. E, frente a isso, um Comitê formado pela sociedade civil, cuja escolha e referendo pôde ser acompanhada em tempo real pelos membros participantes do Fala São João.
O Comitê irá reproduzir o que já acontece no Fala São João. Não se trata de um grupo com uma liderança única. Tampouco é a sala de estar de alguém. Pela tribuna do Fala, desfilam celebridades efêmeras que ora cobram sinalização eficiente nas ruas, ora denunciam o corte de árvores, questionam o plantio de cana, discutem arte, cpis, vagas na Câmara, projetos mal feitos e ainda acham tempo para fazer poesia convidar para os mais diferentes eventos e ainda rir e chorar diante dos dissabores e da alegria da vida. Ouso dizer que no Fala, todos os seus 390 membros terão , ainda, a sua liderança manifesta. O mesmo tendo a acontecer com os 22 membros do Comitê do Lixo.
O que acontece aqui, encontra eco num movimento muito maior que só pode ser explicado pelo avanço dos meios modernos de comunicação. A internet rápida, os grupos de bate-papo, as mensagens nos celulares tiraram a humanidade do papel de expectadores e fez com que as pessoas começassem a reivindicar um novo papel na vida politica. Hoje, não se conformam mais em serem pacientes das decisões tomadas pelos agentes políticos constituídos e reivindicam o papel de protagonistas.
Em todos os rincões do mundo, são bilhões de pessos que fizeram da internet a ferramenta ideal para dar a sua contribuição pessoal para o mundo em que habita. Nem sempre a contribuição é uma ação civil. Muitas vezes ela se dá no campo da música, no compartilhamento de mensagens de auto estima ou de fé, na elaboração de uma nova maneira espiritual de viver, ou ainda de contar uma piada... Não importa muito o que se faz. O que motiva as pessoas é a possibilidade de dizer algo, sentir-se vivo e parte de um mundo maior. De compartilhar as suas crenças e valores. De fazer junto.
Nesta nova fase da aventura humana neste planeta, o personagem virtual, habitante de um metaverso ainda a ser explorado, resvala em múltiplas abordagens e começa a consolidar uma nova forma de se relacionar com a vida em sociedade.
Resta evidente, que neste momento a democracia representativa , exercida através dos partidos que se reduziram a máquinas para disputar o poder pelo poder, sem qualquer linha mestra de atuação, não representa mais a sociedade.
O que presenciamos hoje na cidade é um processo vivo e pode ser exercido, até mesmo, por quem tem um mandato eletivo, mas é no seio da sociedade que ele se alimenta, porque qualquer um de nós, em qualquer momento, podemos atender ao chamado e mudar o curso de uma história.
Há um caminho novo a ser percorrido. Novas linguagem e estruturas estão se formando. Há em todo canto demanda por participação e, ainda bem, os jovens vem se levantando para fazer ruir as velhas estruturas.
Por isso tudo, quando se olha o que está sendo construído em São João, no entorno do Fala São João e do Fórum do Lixo, com os olhos do passado, a visão não é clara. Não dá para usar ferramentas antigas para tentar entender o novo. O velho é expurgado porque está na superficie de uma comunicação feita na periferia, pelas bordas, onde prevalece a mediação pelo consenso em contrapartida à ditadura da maioria.
É simples é complexo ao mesmo tempo. Não há previsões fáceis para onde tudo isso caminha. Mas sobre este processo pode-se dizer que se trata de um projeto suprapartidário, sem vínculos e máculas, onde o compromisso maior é o de construir avanços. Sem medo e sem predisposições tendo a coragem de surfar na crista de uma nova onda.
1 comentários:
Adorei seu texto! Está ficando redundante falar bem dos textos da Bell Pereira... Beijão!
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