3- Houve situações engraçadas que ficaram marcadas em sua memória?
Muitas. Tinham as histórias de fantasmas que rondavam o jornal e que apareciam à noite. Durante o dia o jornal era ponto de encontro: barulhento, cheio de gente, de políticos, de reuniões e conspirações. Tinha muita energia. Quando ficava tudo quieto, apareciam uns barulhos estranhos. Sem contar uma fantasma loira que era minha amiga e que de vez em quando sentava na redação.Tinha gente que não ficava no jornal depois de escurecer de jeito nenhum! Mas as melhores histórias eram as protagonizadas por nós mesmos e por um festival de bobagens que se falava e se escrevia, algumas vezes. De 1998 até 2004, quase toda a redação era formada por mulheres. Os homens eram estranhos no ninho e escolhidos a dedo. Mandá-los fazer matérias de moda, por exemplo, era diversão garantida! As reuniões de pauta podiam durar uma tarde inteira! Ríamos muito e na maioria das vezes de nós mesmos. A reunião de pauta, quando o dr. Joaquim não estava, começava com um assunto, discutia a relação, ralhava com filhos, trocava receita, falava de música, literatura, moda, do fim de semana, dos namoros e no fim das contas, daquela salada, saía uma pauta bastante decente, o que era um assombro! Nao tinha uma urgência para corrrer para a frente do computador, entrar no email, postar no Facebook. Com isso sobrava tempo para esmiuçar o assunto, contar histórias e dar contexto para quem estava chegando que é a melhor maneira de ensinar alguém. Tinham histórias que viravam piada, só depois do acontecido. Uma delas foi a da “Rainha do Apocalipse”. Em 1996 ou 1997 teve um “surto” de aparições de Ets, “Chupa-Cabras”, luzes misteriosas e afins. Foi um pouco depois do ET de Varginha. No jornal ligavam pessoas para dar conta destes casos e eu e uma amiga, a Cristina Lerosa, íamos em tudo quanto é lugar que alguém falava que tinha visto alguma dessas coisas estranhas. Na Prata era um festival disso, principalmente no São Roque. O “consultor” era o Varanda que tinha uma OnG de ufologia, ou algo assim, e dava ares científicos para aqueles momentos que mesclavam misticismo, medo e alguma picaretagem. Bom, a nossa “carreira” de caçar ET terminou quando uma mulher me ligou e disse que todo mundo via essas coisas, mas que era só com ela que eles falavam.
Eu liguei para a Cris e uma hora depois, lá estávamos nós, numa casinha na Vila Conceição, para ver a mulher que falava com os ETs. Lá, uma senhora que era só pele e osso, vestida num vestido que parecia um saco, nos recebeu. Ela pediu para entrarmos, trancou a porta e enfiou a chave dentro da roupa.
Nos já ficamos aprensivas, mas estávamos tão impressionadas com a aparência da mulher que não falamos nada. A sala onde entramos era branca, sem nada nas paredes e um chão de piso frio. Quase não tinha móveis, só um sofá de alvenaria, que contornava a sala, sem almofadas, uma mesa com duas cadeiras e uma estante. Explicou a mulher que o Ele ( ela se referia assim ao ser de outro planeta) não deixava ela ter nada e que também não deixava ela comer, porque não precisava, uma vez que o fim estava próximo. Ela despencou a falar um monte de bobagens e eu resolvi gravar para tentar interromper o monólogo e fazer perguntas. Quando peguei o gravador na bolsa e coloquei perto dela, ela quase me agrediu, começou a gritar e disse que não podia, que Ele ia chegar e matava todo mundo. Dizia que ela já estava sentido a sua chegada e Ele estava muito bravo. No seu surto psicótico aquilo foi num crescendo e só piorava. Lembro ela em pé, falando, gesticulando que tinha chegado o fim. Não conseguia entender como algúem tão magro tinha tanta vitalidade...Parecia que era mesmo o nosso fim. Ela falava que vivíamos o apocalipse e quando tudo terminasse ela seria coroada a Rainha e reinaria ao lado D'Ele.
A gente quase que nem respirava e só pensava como é que ia sair dali, enquanto ela insinuava que, como Rainha, ia gerar o filho prometido, para formar uma nova raça. Bom, no auge do delírio e do nosso medo, ouvimos umas pancadas altas na porta do fundo. Ela levantou para abrir a porta e aí parecia cena de filme de terror. Ela tirou de dentro do vestido uma chave grande e abriu a porta que fez um rangido alto e fino. Pela porta entrou primeiro um cachorro todo estranho e uma outra velha, ainda mais magra que a outra, mas com os ossos das pernas e dos braços todos tortos, como se tivessem quebrado e colado errado! Foi uma visão assustadora. Eu e a Cris ficamos imóveis vendo a velha se arrastar na nossa frente e seguir em direção ao quarto, enquanto a outra a xingava porque estava interrompendo e que o ET já ia chegar. Quando conseguimos nos recompor olhamos uma para a outra, e para a porta que ainda estava aberta e num pulo saímos, quase correndo. Nem sei o que falamos para a mulher. Foi a última vez que fomos caçar ETs. Apelidamos o caso de “Rainha do Apocalipse” e ele já nos rendeu boas risadas, em situaçoes diversas. Naquele dia, quando voltei ao jornal pedi para ligarem nos vizinhos das senhoras e apuraram que eram mãe e filha e totalmente loucas. Chamamos a Prefeitura e soube que foram internadas, com desnutrição severa. Depois nunca mais soube delas.
A participação da Cris nesta história é emblemática. O jornal não era feito só por quem trabalhava nele, mas tínhamos um monte de amigos que ajudavam, iam junto, investigavam com a gente, tiravam fotos – às vezes com as suas próprias máquinas - e até faziam as vezes de guarda-costas. Um destes, com bastante frequencia, era o Marquinho do Sindicato, que ajudava nas matérias de meio ambiente, sobretudo quando eram denúncias. Geralmente eram pautas da Ana Paula. Lembro dela, já gravidona, indo ver uma denúncia de esgoto clandestino e o Marquinho junto, de anjo da guarda. Não eram coisas planejadas! Apenas aconteciam assim. Era o jeito de fazer e no fim todo mundo era um pouco “dono”.
E não tinha bola dividida em que não entrássemos. Qualquer denúncia, a gente investigava. Quando lançamos um selo: “ O Municipio, a Arma do Povo”, não dávamos conta das reclamações e das denúncias. Tinha fila.
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1 comentários:
hehehehe, que medo... adorei!!!
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